28 DE SETEMBRO DE 2023
OPERA: Suor e devoção
FICHA TÉCNICA
Direção de fotografia: Diego Luis
Música: Zé Tom
Iniciamos a concepção do nosso espaço físico em fevereiro de 2020, quando fizemos a primeira visita à sala 1307 do edifício Rural Bank, no centro de Vitória. Ao observarmos os detalhes ali existentes, logo imaginamos os locais onde entrariam as plantas, as mesas e as cadeiras e logo no dia primeiro de março adentramos ao imóvel. Levamos pouquíssimas coisas, precisamente, um aparador, duas mesas e três cadeiras. As primeiras plantas chegaram logo depois, provenientes de uma poda ao jardim da casa dos meus pais no bairro Horto, onde algumas mudas nos foram concedidas, levamos também duas samambaias. No dia 15 de março, exatamente quinze dias após a nossa entrada ao espaço, a pandemia se alastrava de forma trágica pelo mundo, o que nos fez juntar algumas plantas, fecharmos as portas e nos isolarmos em quarentena. No carro havia espaço apenas para algumas plantas e, infelizmente, as samambaias não foram contempladas. Um mês e meio após o primeiro isolamento, passamos a frequentar esporadicamente o escritório em horários alternados. Em minha primeira chegada após o período, me lembro de abrir a porta, observar o sol atravessando a película azul que havia no vidro e as samambaias, mortas ou talvez encantadas, porém sem nenhuma folha caída e com uma cor amarelada única e lindíssima. Encarei aquela transformação como um claro sinal de uma ponta de esperança e beleza diante dos dias sombrios que ainda se intensificariam nos dias e anos seguintes. Desde então elas permanecem em nosso espaço e nos lembram sempre do caminho, das perdas e, principalmente, nos ensinam a enxergar beleza diante de qualquer circunstância. Conforme a rotina foi se revelando aos nossos dias de trabalho no escritório, sem pressa, começamos a educar o olhar para perceber o que precisávamos, para construirmos uma sala coerente com o nosso momento e com que acreditamos. Aos poucos fomos levando livros que líamos e consultávamos, novas plantas que não são indicadas para espaço interno, mas por nossa insistência e cuidado, vivem com saúde e nos proporcionam uma relação com aspectos naturais de maneira direta, começamos a convidar pessoas queridas para tardes lindas de cafés e boas conversas, fomos presenteados com quadros, vinhos, cafés e começamos a fazer com que a sala se tornasse reflexo de todo esse convívio. No ano de 2022 tudo começou a ficar mais dinâmico, nosso trabalho começou a romper com os limites da nossa cidade e passamos a ter uma rotina de viagens bem acentuada. Por graça, fomos lançados aos interiores do Brasil, percorremos entre 2022 e 2023 quase 20 estados e suas respectivas profundezas nos projetaram ao contato com o que há de mais nobre, na nossa concepção, em nosso país: a diversidade. Essa diversidade retratada em itens, presentes, obras e singelezas, moldaram e continuam moldando a nossa identidade e são refletidas no espaço em que, constantemente, insistimos em criar, agora nas salas 1307 e também 1306 do mesmo prédio de arquitetura modernista no centro de nossa cidade. Espero muito que essa construção nunca termine, afinal, é na dinâmica onde há mais vida, mais cor e horizontes mais largos. Somos indagados pelos visitantes com alguma frequência sobre uma misticidade que parece pairar o espaço e constantemente pensamos nesse aspecto. Imagino que o fruto da intencionalidade em cada detalhe é que proporciona um contato com uma experiência estética, emocional, onde tudo parece fluir de forma harmônica: a memória, as cores, o aroma, as sonoridades, as plantas, o vento sobre as plantas, a cidade acontecendo diante de um espaço com ares de refúgio, a movimentação de grandes navios no porto acontecendo diante da nossa janela, o incentivo aos pés descalços sobre a textura do chão de taco e tantos outros detalhes que a presença física incita. Tudo remonta e conta uma história, em nosso caso, também aponta para a transcendência, possibilitando interpretações muito pessoais com quem se relaciona com o espaço, nunca esgotando-o em nossa opinião, mas abrindo portas para que outros imaginários sejam não só criados, mas também acessados e para isso, continuamos a criar cultura sob a perspectiva do cultivo para nunca perdermos a dimensão ritualística que existe neste ato. Com um fio de sensibilidade percebe-se a espiritualidade nas coisas, um tipo de fé que ocorre na vida comum, como aprendemos com tantos mestres pelo chão desse país. Para além dos trabalhos, projetos e entregas, o que nos fundamenta tem valor de importância proporcional ao que desenvolvemos. Para conhecer, considere um café!
